Notícia publicada recentemente no jornal Valor Econômico informa que a Receita Federal vai fiscalizar as compensações com créditos tributários decorrentes de ação judicial.
O contribuinte que apurar crédito, inclusive os judiciais com trânsito em julgado, relativo a tributo ou contribuição administrado pela Receita Federal do Brasil, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utilizá-lo na compensação de débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a quaisquer tributos ou contribuições por ela administrados.
Os créditos apurados anteriormente a 01/01/1996 são atualizados monetariamente até 31 de dezembro de 1995 e, a partir de então, o valor apurado será acrescido de juros obtidos pela aplicação da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC. Já os créditos apurados a partir de 01/01/1996 obedecem ordinariamente às seguintes regras:
b) após 31 de dezembro de 1997, a partir do mês subsequente ao do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição, e de um por cento relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.
No início, os pedidos de restituição, ressarcimento e compensação eram feitos por meio de formulários, cabendo ao contribuinte controlar o valor dos créditos e débitos compensados.
Dado que aplicação da variação da Taxa Selic se dá de forma simples e não composta, a compensação de créditos acontecerá da seguinte forma:
Supondo que o contribuinte tenha um crédito cujo pagamento tenha se dado em 15/06/2019, no montante de R$ 1.000,00, e deseja compensar um débito de R$ 700,00 com vencimento em 15/12/2019. De agosto a novembro de 2019, a Taxa Selic acumulada foi de 1,82%, sendo que para o mês em que está sendo efetuada a compensação, os juros são de mais 1%.
Na data da compensação, o crédito principal, acrescido do valor dos juros, perfaz o total de R$ 1.028,20 (valor atualizado), sendo R$ 1.000,00 de principal e R$ 28,20 de juros. Como o valor dos juros não compõe o principal, a RFB determina que havendo acréscimo de juros sobre o crédito, a compensação será efetuada com a utilização do crédito e dos juros compensatórios, de forma proporcional. Nesse exemplo, os juros representam 2,7443% do valor atualizado (28,20/1028,20). Portanto, a compensação do débito se dará da seguinte forma:
a) 2,7443% do débito será pago com juros incorridos até o momento, ou seja, R$ 19,20.
b) O restante do débito, no caso R$ 680,80, será subtraído do valor principal do crédito, resultando num saldo de R$ 319,20.
Na próxima compensação, o saldo do crédito principal sofrerá novamente a incidência da Selic, a partir de agosto de 2019 até o mês anterior ao vencimento do débito, acrescido de mais 1%.
Para facilitar o cálculo, a Receita Federal do Brasil usa o método de imputação, que consiste em trazer o débito a valor presente, considerando a data do crédito. No exemplo acima, o valor do débito na data do crédito seria o resultado de 700,00/(1+2,82%), ou seja, R$ 680,80. Ao subtrairmos esse montante do principal, chegaríamos ao mesmo saldo de R$ 319,20.
A partir da disponibilização do programa PER/DCOMP, esse cálculo passou a ser feito diretamente pelo software, sendo necessário apenas que o contribuinte mantenha as tabelas de índices atualizadas no Programa PGD. O programa não só disponibiliza o valor do crédito atualizado como também o saldo do crédito original após as compensações. O mesmo acontece quando contribuinte usa o PER/DCOMP Web.
A dificuldade no controle do saldo acontece quando a compensação envolve créditos decorrentes de ação judicial. Diferente de outras modalidades, a compensação de créditos decorrentes de ação judicial envolve o encontro dos débitos compensados com créditos de diversos períodos de apuração. Dada a complexidade do cálculo, o Programa PER/DCOMP exige apenas que o contribuinte preencha os seguintes campos:
Valor Atualizado do Crédito Inicial: Informar o valor do total do crédito objeto de reconhecimento judicial, sem nenhuma dedução. O valor informado deverá estar atualizado até a data do envio do Pedido Eletrônico de Restituição (retificador) ou da Declaração de Compensação, na forma prevista na legislação tributária federal (acréscimo de juros Selic) ou, quando for o caso, na forma prevista na decisão judicial que reconheceu o direito creditório.
Crédito Atualizado na Data da Transmissão: Informar o valor do crédito relativo a tributo ou contribuição pagos indevidamente ou a maior, referente ao período compreendido entre as datas informadas nos campos “Data do Período Inicial” e “Data do Período Final”, que foi reconhecido judicialmente e que, à data do envio do Pedido Eletrônico de Restituição (retificado) ou da Declaração de Compensação, será detido pela pessoa jurídica em nome da qual está sendo formulado o pedido (retificador) ou a declaração (montante do crédito reconhecido judicialmente, deduzido dos valores já restituídos ou já utilizados na compensação de débitos relativos aos tributos e contribuições administrados pela RFB, até a data de envio do documento). Quando nenhuma parcela do crédito tiver sido restituída ou utilizada na compensação de débitos relativos aos tributos e contribuições administrados pela RFB, o valor informado no campo “Crédito Atualizado na Data da Transmissão” deverá ser igual ao do campo “Valor Atualizado do Crédito Inicial”. (…) O valor informado deverá estar atualizado até a data do envio do Pedido Eletrônico de Restituição ou da Declaração de Compensação, na forma prevista na legislação tributária federal (acréscimo de juros Selic) ou, quando for o caso, na forma prevista na decisão judicial que reconheceu o direito creditório.
Assim, cabe ao contribuinte, a cada compensação, determinar quais créditos foram utilizados. Para tanto, o débito deverá ser trazido a valor presente até a data do crédito que se pretende compensar.
Supondo que o contribuinte tenha habilitado o crédito de uma ação judicial que envolve dois períodos de apuração, a seguir:
Crédito | |||
---|---|---|---|
Tributo | Dt Pagamento | Crédito Original | Selic |
COFINS | 15/05/2008 | 50.000,00 | 114,73% |
COFINS | 15/10/2010 | 40.000,00 | 90,13% |
Nesse contexto, pretende compensar o seguinte débito, na data do seu vencimento:
Débito | ||
---|---|---|
Tributo | Vencimento | Débito Original |
IRPJ | 30/11/2020 | 150.000,00 |
Pois bem, confrontando o débito com o primeiro crédito, o contribuinte deve trazer o valor do débito até a data de pagamento do crédito original, mediante a divisão do seu valor pelo resultado da expressão (1 + Selic Acumulada/100). No caso, a Selic acumulada do primeiro crédito é de 114,73%. Portanto o débito deve ser dividido por 2,1473 ((1+114,73%)/100), resultando num débito na data do primeiro crédito no valor de R$ 69.855,17 (150.000/2,1473).
Ao confrontarmos o valor do crédito (R$ 50.000,00) com o débito (R$ 69.855,17) na mesma data, vemos que o crédito não foi suficiente para quitar a totalidade do débito, restando um saldo de R$ 19.855,17. Como esse saldo devedor está a valor presente na data do primeiro crédito, temos que fazer a conta inversa, ou seja, multiplicar o seu resultado por 2,1473, para identificar o montante na data da compensação.
Identificado o saldo devedor na data da compensação, ou seja, R$ 42.635,00, o contribuinte deve trazer o valor do débito até a data de pagamento do próximo crédito original, mediante a divisão do seu valor pelo resultado da expressão (1 + Selic Acumulada/100). No caso, a Selic acumulada do segundo crédito é de 90,13%. Portanto, o débito deve ser dividido por 1,9013 ((1+90,13%)/100), resultando num débito na data do primeiro crédito no valor de R$ 22,424,13.
Ao confrontarmos o valor do crédito (R$ 40.000,00) com o débito (R$ 22.424,13) na mesma data, vemos que o crédito foi suficiente para quitar a totalidade do débito, restando um crédito original de R$ 17.575,87.
Alguns contribuintes, ao tentar simplificar esse cálculo, são levados a erro quando utilizam a proporção entre principal e juros da totalidade do crédito para apurar o quanto foi utilizado do crédito principal. Vejamos o cálculo.
Ao atualizamos ambos os créditos até a data da compensação, chegamos aos seguintes valores:
Crédito | |||||
---|---|---|---|---|---|
Tributo | Dt Pagamento | Crédito Original | Selic | Juros | Total |
COFINS | 15/05/2008 | 50.000,00 | 114,73% | 57.365,00 | 107.365,00 |
COFINS | 15/10/2010 | 40.000,00 | 90,13% | 36.052,00 | 76.052,00 |
Total | 183.417,00 |
Ao proporcionalizamos o montante acima apurado, chegamos aos seguintes percentuais relativos a multa e juros:
Principal | Juros | Total |
90.000,00 | 93.417,00 | 183.417,00 |
49,07% | 50,93% | 100,00% |
Ou seja, na data da compensação, 49,07% do débito será pago com o valor principal do crédito e 50,93% com os juros incorridos até aquele momento. Para identificamos o montante do crédito principal que será utilizado, basta aplicar o percentual do crédito (49,07%) sobre o valor do débito. No caso do nosso exemplo, o valor principal utilizado seria de R$ 73.602,77, conforme abaixo:
Débito | % | Valor |
150.000,00 | 49,07% | 73.602,77 |
Ao confrontarmos esse valor com o total do crédito, restaria um crédito original de R$ 16.397,23:
Principal | Débito | Total |
90.000,00 | 73.602,77 | 16.397,23 |
Ao compararmos ambos os métodos, identificamos que o saldo de crédito original no primeiro método (R$ 17.575,87) é superior ao segundo (R$ 16.397,23). Tal diferença se deve ao fato de que o primeiro método leva em consideração o percentual entre principal e juros de forma individualizada, permitindo que o primeiro crédito, por estar sujeito a incidência de um percentual maior da Selic, compense mais débito. Outrossim, existe uma diferença entre os valores dos créditos originais utilizados no exemplo, o que por si só distorce a incidência da Selic quando fazemos a proporcionalização entre principal e juros pela totalidade dos créditos. No nosso exemplo, chegamos aos seguintes percentuais relativos a multa e juros:
Principal | Juros | Total |
90.000,00 | 93.417,00 | 183.417,00 |
49,07% | 50,93% | 100,00% |
Para que os juros representem 50,93% do total do crédito, o percentual da Selic sobre ambos os créditos teria que ser de 103,80%, conforme abaixo:
Crédito | |||||
---|---|---|---|---|---|
Tributo | Dt Pagamento | Crédito Original | Selic | Juros | Total |
COFINS | 15/05/2008 | 50.000,00 | 103,80% | 51.898,33 | 101.898,33 |
COFINS | 15/10/2010 | 40.000,00 | 103,80% | 41.518,67 | 81.518,67 |
Total | 183.417,00 |
Ao compararmos esse exemplo com o anterior, identificamos que o primeiro crédito está sendo atualizado com um percentual inferior de taxa de juros e o segundo com um percentual superior, resultando daí a distorção identificada.
Cabe destacar que o método de proporcionalização pela totalidade dos créditos pode resultar num saldo de crédito superior ou inferir ao método de proporcionalização individual dos créditos, sendo incorreta a sua utilização, no nosso entender.
Nesse contexto, somos de opinião que o contribuinte deve estar atento ao controle dos créditos compensados, pois quando da análise do pedido, a Receita Federal do Brasil fiscalizará os créditos período a período, podendo em alguns deles acatar integralmente o valor pleiteado e em outros glosá-los parcial ou totalmente, acarretando significativas mudança do “mapa de compensações”.
Já existem no mercado soluções que fazem esse trabalho de forma automática e dinâmica. Entre elas se destaca o CIC – Controle Inteligente de Compensações, cuja finalidade, como o próprio nome sugere, é controlar o processo de compensação desde o pedido inicial até a sua finalização no âmbito administrativo.
No que diz respeito à compensação dos créditos decorrentes de ação judicial, o CIC controla as compensações de forma simples e objetiva, permitindo que o contribuinte identifique quais créditos foram compensados com quais débitos, além de controlar o saldo do crédito original e atualizado.